quarta-feira, 11 de maio de 2016

Crise econômica de 2008: uma das origens da crise atual



         A crise econômica de 2008 e o Brasil

Do segundo semestre de 2007 e por todo ano de 2008 uma crise centralizou as atenções tanto de leigos quanto de especialistas pelo mundo. Nesse período houve desaceleração na economia dos Estados Unidos e, por meio das relações comerciais que o unem no mundo globalizado o problema respingou para todos os continentes.
No contexto econômico:
A crise surge quando as expectativas, que geraram um determinado nível de eficiência marginal do capital são frustradas, eram falsas ou exageradas. O resultado é um sobre investimento seguido de um corte na demanda efetiva (pela retratação do investimento e do próprio consumo), além da elevação na taxa de juros, dado o aumento da incerteza e da inquietude em relação ao futuro. Nesse caso, a economia entra em recessão e se inicia um processo cumulativo de retração de gastos e do emprego. A saída da crise está na recuperação da eficiência marginal do capital (HERSEN & LIMA, 2010, p. 32).
Como efeito da globalização, os problemas oriundos dos países sede da crise financeira acabaram se espalhando para diferentes nações, sendo que embora o núcleo da crise internacional estivesse concentrado nas economias avançadas, seus efeitos alcançaram os países emergentes e em desenvolvimento no último trimestre de 2008.
O crescimento do PIB do grupo dessas economias registrou no ano de 2008 expansão de 6,1% em relação à média do ano anterior (INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA, 2010, p. 14), ao passo que no quarto trimestre, desacelerou para 3,3%, contra um crescimento econômico médio de 7,7% entre 2004 e 2007. E o Brasil estando inserido nos mercados globalizados acabou sendo contaminado pela crise econômica a partir do mês de outubro de 2008, o que resultou na diminuição do seu Produto Interno Bruto (PIB) em mais de 4% entre o último trimestre do ano no primeiro semestre de 2009, tendo como principal responsável o setor industrial, que teve redução de 11,6% nesse período.
No entanto, como será demonstrado ao longo deste trabalho, mesmo com os sinais da recessão industrial na economia brasileira, há situações distintas entre os setores de atividade, com dimensões diferenciadas no total da produção e da ocupação nacional, ou seja, enquanto a queda da produção atingiu fundamentalmente o setor industrial, o de serviços apresentava expansão (POCHMANN, 2009, p. 41).
Entre alguns fatores que merecem destaque para os problemas enfrentados pelas empresas dos diferentes setores no ano de 2008 estava a elevação dos juros, vez que:
A elevação da taxa de juros contribuiu para que o real mantivesse tendência de valorização frente ao dólar até o terceiro trimestre de 2008. Entre os meses de janeiro a agosto a taxa de câmbio nominal registrou apreciação acumulada de 10,0%, passando de R$ 1,77 para R$ 1,61 por dólar. Esta trajetória foi rompida em setembro, a partir das turbulências decorrentes do agravamento da crise econômica internacional que acarretaram brusca desvalorização do real, tendo a moeda atingido o valor de R$ 2,39 por dólar no mês de dezembro (Gráfico 4)9. Apesar da desvalorização observada nos últimos quatro meses do ano, a média da taxa de câmbio nominal passou de R$ 1,95 para R$ 1,83 por dólar entre 2007 e 2008 - apreciação de 5,9% (INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA, 2010, p. 15).
Observa-se que com a crise financeira surgiram as tentativas dos governos dos Estados Unidos, da União Europeia e do Brasil em diminuir os efeitos da crise, por políticas macroeconômicas ou voltadas para a economia nacional. Segundo Fruchs (2010, p. 36) a força com que os mercados foram atingidos foi diferente nessas três regiões: ”enquanto a Europa sofria diretamente com as perdas no mercado imobiliário norte americano, no Brasil a preocupação eram as variações cambiais e a escassez de crédito”.

Mas isso não muda o fato que os países sofreram com a crise e tiverem uma queda no PIB e que tentaram contornar a crise com medidas similares para tranquilizar os mercados e em segunda instância reverter A Tabela atual. Já o Brasil, diferentemente de alguns países, não precisava socorrer os bancos nacionais. Em vez disso, o país focou-se ao incentivo e aumento do consumo interno:
Para estimular o mercado interno, o governo brasileiro adotou várias medidas, entre elas a redução do IPI (imposto sobre produtos industrializados) para a linha branca de eletrodomésticos, para a compra de motos, diminuição de impostos sobre materiais de construção e redução do imposto sobre a venda de carros e caminhões (FRUCHS, 2010, p. 39).
Scholögl (2011, p. 25) lembra que as primeiras medidas adotadas pelo governo Lula da Silva “causaram estranheza em inúmeros segmentos que criticavam a política neoliberal em curso, que até então procurava acomodar os interesses de setores mais conservadores da sociedade, dentre estes, evidentemente, o mercado financeiro”. Para contornar a crise o Brasil procurou tornar as exportações mais atrativas.
Para isso, propôs em maio de 2010 a criação do Exim-Brasil, banco ligado ao BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) para financiar as exportações, bem como a devolução rápida de créditos, unificação de fundos de garantia e a criação de empresa especialmente para o setor (FRUCHS, 2010, p. 40).
Fruchs (2010, p. 54) ressalta as medidas trabalhadas pelo Banco Central, que atuou na diminuição das flutuações cambiais, reestabelecendo a liquidez com a liberalização dos compulsórios, e o governo, que em vez de entrar com pacotes bilionários optou pela redução do IPI de automóveis e eletrodomésticos e investimentos na infraestrutura e na renovação de escolas públicas, portos e aeroporto com o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC).
Quanto à política econômica que reduziu as alíquotas do IPI observa-se que:
[...] foi claramente concebida no sentido de promover a manutenção da produção e do emprego. Apesar deste tipo de tributação gerar distorções, particularmente na distribuição da renda, ela viabiliza um instrumento de política econômica diferenciada em relação aos que se baseiam na redução da tributação direta ou no aumento dos gastos públicos. São inúmeras as consequências que este tipo de tributação engendra para a condução da política econômica, particularmente para políticas setoriais de estimulo à produção (SCHLÖGL, 2011, p. 12).
Este segundo mandato do presidente Lula se caracteriza por relativa inflexão na condução da política econômica. No início de 2006, “em decorrência de uma crise política, ocorrem modificações que não deixam de guardar intima relação com a própria equipe econômica agora no comando” (SCHLÖGL, 2011, p. 32).
Até 2007 os saldos da balança comercial brasileira são bastante expressivos. No ano de 2008 o resultado apresenta uma retração de grande vulto, persistindo nesta tendência até o fim do governo Lula. Esta modificação nas contas externas é fruto de algumas condicionantes, sendo de extrema relevância a tendência de apreciação do câmbio, que além de tirar a competitividade das exportações torna as importações altamente competitivas no mercado nacional. Outra condicionante importante é a redução da demanda, em particular norte-americana, em função da crise econômica. O volume importado pelos países demandantes reduziu-se e concomitantemente os preços apresentam o mesmo movimento, fazendo com que as receitas de exportações se reduzissem (SCHLÖGL, 2011, p. 33).
Os superávits nas transações correntes que vinham sendo registrados ocorriam em função do bom desempenho da balança comercial. Com a expressiva redução nos superávits comerciais, a partir de 2008 as transações correntes passaram a registrar déficits, movimento que permanece até o final do mandato petista. Em 2010 “registra-se um déficit de aproximadamente US$ 47 bilhões, sendo que o robusto crescimento da economia brasileira gerou maior pressão sobre as importações do período, que apresentou crescimento na margem maior do que as exportações, registrando assim o pior resultado comercial no período em análise” (SCHLÖGL, 2011, p. 33).
No Brasil, quando se analisa o comportamento do PIB sob a ótica da demanda, se evidencia o aumento dos gastos por parte do governo logo depois de deflagrada a crise. Enquanto os outros componentes da demanda agregada apresentaram retração, os gastos públicos continuam crescendo, apesar da redução na margem de crescimento em relação aos outros meses. “Este movimento se expressa nos resultados primários, pois até outubro o governo vinha obtendo superávits todos os meses, mas em novembro e dezembro passou a registrar déficit primário, com relativa estabilidade na receita bruta” (SCHLÖGL, 2011, p. 46).
A execução dos investimentos previstos no Programa Piloto de Investimentos (PPI) do grupo Petrobras também não sofreu ajustes no decorrer de 2009, sendo estes investimentos da ordem de 0,5% do PIB. No transcorrer daquele ano o governo diminuiu a meta de superávit primário de 3,8% do PIB para 2,5%, “visando ter margem para realizar as políticas anticíclicas, pois o baixo crescimento e os benefícios tributários concedidos reduziram a arrecadação e exigiriam um corte nos investimentos caso tivesse que se atingir a meta” (SCHLÖGL, 2011, p. 48).
Ademais da elevação na taxa de desemprego no Brasil, contata-se também uma modificação no perfil do desempregado, especialmente nas grandes regiões metropolitanas. No mês de março de 2009, por exemplo, menos de 54% do total dos desempregos das regiões metropolitanas eram considerados pobres, uma vez que possuíam renda mensal familiar per capita inferior a meio salário mínimo. Se atualmente há, a cada dois desempregados, um que se encontra na situação de pobreza, em março de 2002 havia mais de 66% nessa mesma condição. Ou seja, de cada três desempregados, dois eram pobres, indicando a queda de 18,8% na taxa de pobreza entre os desempregados na comparação do mês de março de 2009 com março de 2002 (POCHMANN, 2009, p. 43).


     Crescimento da crise e o setor financeiro

As medidas recessivas são contraproducentes em uma situação de baixo dinamismo econômico, pois reduzem ainda mais a demanda efetiva e assim agravam a crise. Isso também dificulta a recuperação fiscal em virtude do minguado desempenho da arrecadação decorrente da recessão. Esses países correm o risco de entrarem em uma fase de estagnação, pois não dispõem da possibilidade de forte desvalorização da moeda, que abriria espaço para melhorar as exportações e assim começar uma recuperação. Nesse caso, o euro tornou-se uma camisa de força.
Tais pressões se traduziam em análises opostas a respeito do Estado do bem-estar social e do que fazer com ele. A crise de legitimidade do Estado contemporâneo está ligada exatamente a essa divergência. Enquanto os donos do capital e seus órgãos de representação propunham enxugar o gasto social, os sindicatos e partidos trabalhistas questionavam o sistema de proteção como mecanismo de acomodação dos trabalhadores ao sistema capitalista. Esta última crítica, de inspiração socialista, apontava para as insuficiências do sistema de bem-estar. Teve seu momento, mas na década de 1980 perdeu fôlego diante do reaparecimento da perspectiva liberal, que caminhava em direção oposta: denunciava os excessos da ação estatal (DULCI, 2009, p. 112).
Em 2006 já existiam evidências de graves problemas no setor de financiamento imobiliário, dado os altos índices de inadimplência. O aumento da oferta de imóveis levou a queda dos preços, que exacerbou a inadimplência e gerou a crise. A exacerbação da inadimplência evidenciou que os bancos, fundos de investimentos e pensão e companhias de seguros poderiam estar com suas carteiras de títulos “pobres” (DULCI, 2009, p. 77).
Até aqui esta poderia ser caracterizada como uma crise de inadimplência. O banco retomaria os imóveis na forma contratual e minimizaria suas perdas, com maiores impactos para a instituição que realizou as operações, mas sem grandes desdobramentos para a economia como um todo. No entanto, a estrutura dos mercados financeiros atual, trouxe modificações importantes na dinâmica desta crise. Com uma ampla integração dos mercados financeiros e uma rede de pagamentos e recebimentos articulada dentro do próprio mercado bancário, que em última instância era comprado por fundos de investimento, fundos de pensão, empresas e famílias, esta crise se acentuou (SCHLÖGL, 2011, p. 40).

Países centrais e emergentes

Segundo Dulci (2009, p. 109):
Na virada de 2008 para 2009, verificou-se que os países centrais estavam entrando em recessão. Sobre os países emergentes, porém, o efeito tem sido um pouco diferente. Suas economias apenas desaceleraram, reduzindo a marcha em comparação com os altos índices de crescimento experimentados nos últimos anos. E entre eles há distinções a fazer. Variáveis como o tamanho do mercado interno de cada país e o seu grau de autonomia em relação à economia mundial são cruciais como dimensões de vulnerabilidade ao contágio da crise. Além disso, as condições do sistema financeiro interno, e sua dependência do exterior, certamente contam, e muito (DULCI, 2009, p. 109).
A atenção às diferenças é a base para elaborar comparações a partir das quais se possam extrair inferências mais sólidas sobre a crise e seus desdobramentos do que permite o volume de conhecimento que temos hoje. Por enquanto, sabemos ainda pouco. Palpites de todo tipo têm circulado pelo mundo, e nem sempre transmitem suficiente consistência analítica. Diante disso, podemos tomar como bússola as transformações das últimas décadas e, nesse contexto, situar o que está acontecendo agora. Um balanço do passado é imprescindível para qualquer antecipação do futuro (DULCI, 2009, p. 109).
Com a retração dos fluxos de comércio e capitais e a desaceleração do crédito, os efeitos da crise financeira sobre a atividade econômica no mundo foram sentidos no quarto trimestre de 2008. O PIB mundial do quarto trimestre de 2008, quando comparado ao PIB do quarto trimestre de 2007, registrou variação negativa de 0,1%. Esta desaceleração ocorreu de forma mais acentuada nas economias avançadas, onde a redução foi de 2,2%, com maior destaque para os EUA (-1,9%), Zona do Euro (-1,7%), Japão (-4,5%) e Reino Unido (-1,8%). No ano de 2008, o PIB do grupo das economias avançadas registrou crescimento de 0,5% em relação ao ano anterior (INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA, 2010, p. 14).
Para impedir que o pânico tomasse conta da Europa foi necessário a aprovação, em maio de 2010, de um pacote emergencial de 750 bilhões de euros para socorrer os países em dificuldades. Mais uma vez os Estados nacionais e a União Europeia não pouparam esforços para garantir a continuidade da valorização fictícia do capital, que consiste em uma das principais causas da crise. A saída encontrada por esses países e pela União europeia foi socializar os prejuízos. O ônus do ajuste foi jogado nas costas da classe trabalhadora, pois a contra partida do auxílio financeiro consiste na aplicação de rígidas políticas de combate ao déficit público, que implicam medidas contencionistas. 
Bolha imobiliária
Ou seja, medidas recessivas que resultam no agravamento do desemprego, na redução de salários e na perda de direitos sociais. Mas, “apesar das amplas manifestações de repudio a essas políticas nos países atingidos, a classe trabalhadora não tem conseguido, até o momento, reverter esse Gráfico” (CORSI, 2011, p. 13).
O encontro em Pittsburgh, no final de setembro de 2009, resultou no aumento significativo da importância das reuniões do G20.87 As decisões dos vinte países mais ricos do mundo determinariam a direção da economia mundial, antes reservado para as reuniões do G7 ou G8. Entre as decisões tomadas no G20 de Pittsburgh, estavam as limitações dos bônus dos gerentes, onde os chefes das empresas precisariam focar ganhos em longo prazo e não ganhos arriscados e em curto prazo. Negócios arriscados levaram à bolha financeira que originou a crise atual. Os gerentes foram fortemente criticados, pois embora fossem responsáveis pela crise e mesmo que a empresa necessitasse da ajuda do governo, eles continuaram a ganhar prêmios horrendos (FRUCHS, 2010, p. 45).
A redução no ritmo de crescimento econômico das nações é justificada pela forte dependência externa, tanto no fluxo do comércio exterior quanto no fluxo de capitais. Essa dependência de um país para com o resto do mundo fica evidente ao se analisar as importações de algumas dessas nações. Os EUA, detentor do maior PIB do mundo, no ano de 2008 importaram um montante superior a 15% de seu PIB. Já nos três primeiros trimestres de 2009, não importaram mais que 10,9% em média do valor correspondente ao seu PIB. A Indonésia, entre o fechamento de 2008 e o terceiro trimestre de 2009 deixou de importar mais de 8,7%, comparativamente ao seu PIB (HERSEN & LIMA, 2010, p. 39).
Os primeiros sinais de reversão já começam em 2004, quando os Estados Unidos elevam suas taxas de juros, encarecendo o refinanciamento dos débitos. Em meados de 2006, esse processo emite os seus primeiros sinais de esgotamento com a redução da taxa de crescimento do crédito ao consumo e o leve aumento da inadimplência. Com isso, a eclosão da crise do setor imobiliário era uma questão de tempo (CARCANHOLO, 2010, p. 8).
Ainda no início da crise, o Presidente do FED, Ben Bernanke, aplicou quase 500 bilhões de dólares no mercado imobiliário. Com esse dinheiro, o FED comprou hipotecas e, desse modo, injetou dinheiro parar dar liquidez ao mercado financeiro. Outra forma que o governo adotou para disponibilizar recursos financeiros foi à compra de títulos públicos. A falta de liquidez foi um grande problema durante o auge da crise. Com pouca confiança nas instituições financeiras, a oferta de créditos e empréstimos tornou-se um negócio arriscado (FRUCHS, 2010, p. 30).
Segundo Fruchs (2010) o efeito-contágio da crise sobre as regiões emergentes ocorreu mediante vários canais de transmissão - que derivam das múltiplas relações de interdependência entre as economias emergentes e avançadas -, envolvendo seja a conta corrente (queda dos preços das commodities e da demanda mundial e aumento das remessas de lucros pelas empresas e bancos) seja a conta financeira (menor ingresso de investimento direto, saída dos investimentos de portfólio, interrupção das linhas de crédito comercial e forte contração dos empréstimos bancários).
A crise agravou-se quando os clientes subprimes não honraram seus empréstimos. Para alguns o prejuízo foi perder os imóveis e para outros um endividamento maior que suas rendas, devido à elevação da taxa de juros no mercado. O resultado foi o aumento sem precedentes da inadimplência e a insolvência das instituições financeiras. Os resultados indicam que a crise norte-americana teve início no mercado financeiro e se transferiu posteriormente para o mercado produtivo, pela retração do crédito, desencadeando recessão mundial pelo mercado externo.
Os países de maior dependência externa e maior relação com os Estados Unidos sofreram o impacto de forma mais agressiva (HERSEN & LIMA, 2010, p. 25).
A crise se manifestou inicialmente no segmento do mercado com mais risco, que é aquele representado por tomadores com histórico de inadimplência. Desde julho de 2006 o preço dos imóveis começa a cair, o que reduz a riqueza das famílias e, com juros mais caros, amplia a inadimplência no pagamento das hipotecas, o que reduz ainda mais o crédito imobiliário e gera um processo cumulativo através de uma nova redução no preço dos imóveis. Detonada a crise, o seu processo de expansão e contágio se dá pelo fato de que, ao aumentar a inadimplência, os credores passam a sofrer também com problemas de liquidez e solvência, uma vez que os ativos que eles tinham a receber são desvalorizados e, portanto, seus compromissos financeiros podem não ter mais garantia de pagamento. Os credores são obrigados a vender (parte de) seus ativos em troca de dinheiro para, com este, saldar suas obrigações. Esse movimento de venda de ativos provoca a redução dos seus preços e reforça a pressão pela alta da taxa de juros cobrada pelas instituições financeiras, agravando ainda mais crise (CARCANHOLO, 2010, p. 8).
Os grandes bancos carregados com títulos hipotecários, por sua vez, sofrem uma elevação no montante de seus passivos, uma vez que os juros estão aumentando, ao mesmo tempo em que seus ativos (carregados em “títulos, agora, podres”) se desvalorizam. O resultado é que, reforçado pela redução na oferta de liquidez, a elevação na descapitalização é respondida pelos bancos com a redução na oferta de crédito, o que aprofunda os problemas de liquidez e inadimplência (CARCANHOLO, 2010, p. 8).
A crise atingiu um estado agudo em setembro de 2008 a partir da falência do banco de investimentos Lehman Brothers. Não tanto pelo que esse banco tinha no sistema financeiro norte-americano ou mundial, mas muito mais pelo efeito simbólico, pois trouxe à luz a situação generalizada de insolvência do sistema financeiro no centro do capitalismo (EUA e Europa). Esse episódio desencadeou uma onda de pânico, que não se converteu em corrida geral contra os bancos em virtude da rápida ação dos bancos centrais dos países desenvolvidos, garantindo os depósitos e injetando centenas de bilhões de dólares para evitar o colapso da liquidez do sistema financeiro (CORSI, 2009, p. 77).
A crise financeira rapidamente se desdobrou em crise econômica, sobretudo à forte redução do crédito. Ao atingir a produção a crise ganha nova dinâmica. As quedas na produção, no emprego e nos investimentos alimentam a crise, que se propaga e se aprofunda. A elevação do desemprego vai alimentar o processo, pois muitos tomadores de empréstimos desempregados não terão condições de honrar suas dívidas e, portanto, a inadimplência aumentará. O aumento da inadimplência de empresas e pessoas físicas reforça a degeneração do sistema financeiro, o que por sua vez acelera a crise na produção. A queda da atividade econômica leva a redução das receitas públicas e pode gerar também um processo deflacionário, que potencia a circulo cumulativo da crise (CORSI, 2009, p. 78).
Em busca de rendimentos maiores, gestores de fundos e bancos compram esses títulos subprimes das instituições que fizeram o primeiro empréstimo e permitem que uma nova quantia em dinheiro seja emprestada, antes mesmo do primeiro empréstimo ser pago. Um segundo gestor pode comprar o título adquirido pelo primeiro, e assim por diante, gerando uma cadeia de venda de títulos e uma espiral de especulação financeira.
Os tomadores iniciais de empréstimos não conseguem honrar seus compromissos assumidos e se tem início a uma nova crise do sistema capitalista. Se a crise se restringisse apenas a uma região, no caso os Estados Unidos da América, seus efeitos não seriam tão devastadores sobre a economia mundial. Porém, dada a interdependência das economias, os mecanismos de contágio e transbordamento das crises ainda necessitam de mais estudos (HERSEN & LIMA, 2010, p. 26).
A formação e o estouro de bolas especulativas têm caracterizado o padrão de acumulação do capitalismo globalizado. A instabilidade da economia mundial na fase de predomínio do capital financeiro está intimamente vinculada às bolhas especulativas (BRENNER, 2003 e 2006) (CORSI, 2009, p. 82).
A crise já se ensaiava anteriormente quando da formação da bolha especulativa junto às ações de empresas de alta tecnologia, as famosas empresas pontocom. O estouro dessa bolha nada mais representou do que a desvalorização do capital fictício acumulado especulativamente nesse mercado que, com a sua retração, se viu obrigado a encontrar novos espaços de valorização, ou pelo menos para aquela parcela do capital fictício que sobrou ao estouro dessa bolha (CARCANHOLO, 2010, p. 8).
Essa dinâmica econômica baseada na bolha especulativa com imóveis centrada nos EUA, que descrevemos muito esquematicamente acima, não é novidade na economia mundial no período recente. Desde o final dos anos 1980, o ciclo econômico está vinculado à formação e ao estouro e bolhas especulativas. Entre 1990 e 2007, tanto os momentos de expansão quanto os de retração estiveram condicionado pela formação e pelo estouro de bolhas especulativas. Nesse período, foram seis crises: recessão 1990-1991, México (1994), Sudeste Asiático (1997), Rússia/Brasil/Argentina (1998 – 1999), Nasdaq (2001) e crise da bolha imobiliária (2008). Também ocorreu uma série de crises localizadas nos países centrais, como, por exemplo, as corridas especulativas contra a libra, a lira e a peseta no início dos anos 1990 e a quebra de instituições e poupança nos EUA em 1994. Não caberia nos limites desse artigo detalhar esse processo, pois cada crise tem suas múltiplas determinações, cabe, contudo, ressaltar um aspecto de grande importância, qual seja: esse padrão, de um lado, vincula-se intimamente a hegemonia do capital financeiro e, de outro, a formação de uma nova fronteira de acumulação de capital no Leste Asiático (CORSI, 2011, p. 16).
A bolha das ações da década de 90 demonstrou, por um lado, que teve um extremo otimismo para que se ganhasse muito dinheiro nas negociações com ações e, por outro, que teve a crença que as crises e as recessões eram coisas do passado e assim houve um grande senso de segurança. Assim os preços das ações chegaram a níveis extremamente “espantosos”. A bolha continuou crescendo cada vez mais. Já a segunda bolha, a bolha do setor imobiliário, originou essa crise global. A falta de confiança iria prevalecer por muito tempo no mercado e dado cada vez piore do setor imobiliário afetariam a economia norte americana por muitos meses. O sonho de cada americano de ter a casa própria, que muitas vezes, era comprada com empréstimos. Alan Grenspan mesmo sabendo da bolha não interveio para diminuir os riscos de colapsos maiores (FRUCHS, 2010, p. 21).



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