Do segundo
semestre de 2007 e por todo ano de 2008 uma crise centralizou as
atenções tanto de leigos quanto de especialistas pelo mundo. Nesse
período houve desaceleração na economia dos Estados Unidos e, por
meio das relações comerciais que o unem no mundo globalizado o
problema respingou para todos os continentes.
No contexto econômico:
A
crise surge quando as expectativas, que geraram um determinado nível
de eficiência marginal do capital são frustradas, eram falsas ou
exageradas. O resultado é um sobre investimento seguido de um corte
na demanda efetiva (pela retratação do investimento e do próprio
consumo), além da elevação na taxa de juros, dado o aumento da
incerteza e da inquietude em relação ao futuro. Nesse caso, a
economia entra em recessão e se inicia um processo cumulativo de
retração de gastos e do emprego. A saída da crise está na
recuperação da eficiência marginal do capital (HERSEN & LIMA,
2010, p. 32).
Como
efeito da globalização, os problemas oriundos dos países sede da
crise financeira acabaram se espalhando para diferentes nações,
sendo que embora o núcleo da crise internacional estivesse
concentrado nas economias avançadas, seus efeitos alcançaram os
países emergentes e em desenvolvimento no último trimestre de 2008.
O
crescimento do PIB do grupo dessas economias registrou no ano de 2008
expansão de 6,1% em relação à média do ano anterior (INSTITUTO
BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA, 2010, p. 14), ao passo que no
quarto trimestre, desacelerou para 3,3%, contra um crescimento
econômico médio de 7,7% entre 2004 e 2007. E o Brasil estando
inserido nos mercados globalizados acabou sendo contaminado pela
crise econômica a partir do mês de outubro de 2008, o que resultou
na diminuição do seu Produto Interno Bruto (PIB) em mais de 4%
entre o último trimestre do ano no primeiro semestre de 2009, tendo
como principal responsável o setor industrial, que teve redução de
11,6% nesse período.
No
entanto, como será demonstrado ao longo deste trabalho, mesmo com os
sinais da recessão industrial na economia brasileira, há situações
distintas entre os setores de atividade, com dimensões diferenciadas
no total da produção e da ocupação nacional, ou seja, enquanto a
queda da produção atingiu fundamentalmente o setor industrial, o de
serviços apresentava expansão (POCHMANN, 2009, p. 41).
Entre
alguns fatores que merecem destaque para os problemas enfrentados
pelas empresas dos diferentes setores no ano de 2008 estava a
elevação dos juros, vez que:
A
elevação da taxa de juros contribuiu para que o real mantivesse
tendência de valorização frente ao dólar até o terceiro
trimestre de 2008. Entre os meses de janeiro a agosto a taxa de
câmbio nominal registrou apreciação acumulada de 10,0%, passando
de R$ 1,77 para R$ 1,61 por dólar. Esta trajetória foi rompida em
setembro, a partir das turbulências decorrentes do agravamento da
crise econômica internacional que acarretaram brusca desvalorização
do real, tendo a moeda atingido o valor de R$ 2,39 por dólar no mês
de dezembro (Gráfico 4)9.
Apesar da desvalorização observada nos últimos quatro meses do
ano, a média da taxa de câmbio nominal passou de R$ 1,95 para R$
1,83 por dólar entre 2007 e 2008 - apreciação de 5,9% (INSTITUTO
BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA, 2010, p. 15).
Observa-se
que com a crise financeira surgiram as tentativas dos governos dos
Estados Unidos, da União Europeia e do Brasil em diminuir os efeitos
da crise, por políticas macroeconômicas ou voltadas para a economia
nacional. Segundo Fruchs (2010, p. 36) a força com que os mercados
foram atingidos foi diferente nessas três regiões: ”enquanto a
Europa sofria diretamente com as perdas no mercado imobiliário norte
americano, no Brasil a preocupação eram as variações cambiais e a
escassez de crédito”.
Mas isso
não muda o fato que os países sofreram com a crise e tiverem uma
queda no PIB e que tentaram contornar a crise com medidas similares
para tranquilizar os mercados e em segunda instância reverter A
Tabela atual. Já o Brasil, diferentemente de alguns países, não
precisava socorrer os bancos nacionais. Em vez disso, o país
focou-se ao incentivo e aumento do consumo interno:
Para
estimular o mercado interno, o governo brasileiro adotou várias
medidas, entre elas a redução do IPI (imposto sobre produtos
industrializados) para a linha branca de eletrodomésticos, para a
compra de motos, diminuição de impostos sobre materiais de
construção e redução do imposto sobre a venda de carros e
caminhões (FRUCHS, 2010, p. 39).
Scholögl
(2011, p. 25) lembra que as primeiras medidas adotadas pelo governo
Lula da Silva “causaram estranheza em inúmeros segmentos que
criticavam a política neoliberal em curso, que até então procurava
acomodar os interesses de setores mais conservadores da sociedade,
dentre estes, evidentemente, o mercado financeiro”. Para contornar
a crise o Brasil procurou tornar as exportações mais atrativas.
Para isso,
propôs em maio de 2010 a criação do Exim-Brasil, banco
ligado ao BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e
Social) para financiar as exportações, bem como a devolução
rápida de créditos, unificação de fundos de garantia e a criação
de empresa especialmente para o setor (FRUCHS, 2010, p. 40).
Fruchs
(2010, p. 54) ressalta as medidas trabalhadas pelo Banco Central, que
atuou na diminuição das flutuações cambiais, reestabelecendo a
liquidez com a liberalização dos compulsórios, e o governo, que em
vez de entrar com pacotes bilionários optou pela redução do IPI de
automóveis e
eletrodomésticos e investimentos na infraestrutura e na renovação
de escolas públicas, portos e aeroporto com o Programa de Aceleração
do Crescimento (PAC).
Quanto à
política econômica que reduziu as alíquotas do IPI observa-se que:
[...]
foi claramente concebida no sentido de promover a manutenção da
produção e do emprego. Apesar deste tipo de tributação gerar
distorções, particularmente na distribuição da renda, ela
viabiliza um instrumento de política econômica diferenciada em
relação aos que se baseiam na redução da tributação direta ou
no aumento dos gastos públicos. São inúmeras as consequências que
este tipo de tributação engendra para a condução da política
econômica, particularmente para políticas setoriais de estimulo à
produção (SCHLÖGL, 2011, p. 12).
Este
segundo mandato do presidente Lula se caracteriza por relativa
inflexão na condução da política econômica. No início de 2006,
“em decorrência de uma crise política, ocorrem modificações que
não deixam de guardar intima relação com a própria equipe
econômica agora no comando” (SCHLÖGL, 2011, p. 32).
Até
2007 os saldos da balança comercial brasileira são bastante
expressivos. No ano de 2008 o resultado apresenta uma retração de
grande vulto, persistindo nesta tendência até o fim do governo
Lula. Esta modificação nas contas externas é fruto de algumas
condicionantes, sendo de extrema relevância a tendência de
apreciação do câmbio, que além de tirar a competitividade das
exportações torna as importações altamente competitivas no
mercado nacional. Outra condicionante importante é a redução da
demanda, em particular norte-americana, em função da crise
econômica. O volume importado pelos países demandantes reduziu-se e
concomitantemente os preços apresentam o mesmo movimento, fazendo
com que as receitas de exportações se reduzissem (SCHLÖGL, 2011,
p. 33).
Os
superávits nas transações correntes que vinham sendo registrados
ocorriam em função do bom desempenho da balança comercial. Com a
expressiva redução nos superávits comerciais, a partir de 2008 as
transações correntes passaram a registrar déficits, movimento que
permanece até o final do mandato petista. Em 2010 “registra-se um
déficit de aproximadamente US$ 47 bilhões, sendo que o robusto
crescimento da economia brasileira gerou maior pressão sobre as
importações do período, que apresentou crescimento na margem maior
do que as exportações, registrando assim o pior resultado comercial
no período em análise” (SCHLÖGL, 2011, p. 33).
No Brasil,
quando se analisa o comportamento do PIB sob a ótica da demanda, se
evidencia o aumento dos gastos por parte do governo logo depois de
deflagrada a crise. Enquanto os outros componentes da demanda
agregada apresentaram retração, os gastos públicos continuam
crescendo, apesar da redução na margem de crescimento em relação
aos outros meses. “Este movimento se expressa nos resultados
primários, pois até outubro o governo vinha obtendo superávits
todos os meses, mas em novembro e dezembro passou a registrar déficit
primário, com relativa estabilidade na receita bruta” (SCHLÖGL,
2011, p. 46).
A execução
dos investimentos previstos no Programa Piloto de Investimentos (PPI)
do grupo Petrobras também não sofreu ajustes no decorrer de 2009,
sendo estes investimentos da ordem de 0,5% do PIB. No transcorrer
daquele ano o governo diminuiu a meta de superávit primário de 3,8%
do PIB para 2,5%, “visando ter margem para realizar as políticas
anticíclicas, pois o baixo crescimento e os benefícios tributários
concedidos reduziram a arrecadação e exigiriam um corte nos
investimentos caso tivesse que se atingir a meta” (SCHLÖGL, 2011,
p. 48).
Ademais
da elevação na taxa de desemprego no Brasil, contata-se também uma
modificação no perfil do desempregado, especialmente nas grandes
regiões metropolitanas. No mês de março de 2009, por exemplo,
menos de 54% do total dos desempregos das regiões metropolitanas
eram considerados pobres, uma vez que possuíam renda mensal familiar
per capita inferior
a meio salário mínimo. Se atualmente há, a cada dois
desempregados, um que se encontra na situação de pobreza, em março
de 2002 havia mais de 66% nessa mesma condição. Ou seja, de cada
três desempregados, dois eram pobres, indicando a queda de 18,8% na
taxa de pobreza entre os desempregados na comparação do mês de
março de 2009 com março de 2002 (POCHMANN, 2009, p. 43).
Crescimento da crise e o setor financeiro
As medidas
recessivas são contraproducentes em uma situação de baixo
dinamismo econômico, pois reduzem ainda mais a demanda efetiva e
assim agravam a crise. Isso também dificulta a recuperação fiscal
em virtude do minguado desempenho da arrecadação decorrente da
recessão. Esses países correm o risco de entrarem em uma fase de
estagnação, pois não dispõem da possibilidade de forte
desvalorização da moeda, que abriria espaço para melhorar as
exportações e assim começar uma recuperação. Nesse caso, o euro
tornou-se uma camisa de força.
Tais
pressões se traduziam em análises opostas a respeito do Estado do
bem-estar social e do que fazer com ele. A crise de legitimidade do
Estado contemporâneo está ligada exatamente a essa divergência.
Enquanto os donos do capital e seus órgãos de representação
propunham enxugar o gasto social, os sindicatos e partidos
trabalhistas questionavam o sistema de proteção como mecanismo de
acomodação dos trabalhadores ao sistema capitalista. Esta última
crítica, de inspiração socialista, apontava para as insuficiências
do sistema de bem-estar. Teve seu momento, mas na década de 1980
perdeu fôlego diante do reaparecimento da perspectiva liberal, que
caminhava em direção oposta: denunciava os excessos da ação
estatal (DULCI, 2009, p. 112).
Em 2006 já
existiam evidências de graves problemas no setor de financiamento
imobiliário, dado os altos índices de inadimplência. O aumento da
oferta de imóveis levou a queda dos preços, que exacerbou a
inadimplência e gerou a crise. A exacerbação da inadimplência
evidenciou que os bancos, fundos de investimentos e pensão e
companhias de seguros poderiam estar com suas carteiras de títulos
“pobres” (DULCI, 2009, p. 77).
Até
aqui esta poderia ser caracterizada como uma crise de inadimplência.
O banco retomaria os imóveis na forma contratual e minimizaria suas
perdas, com maiores impactos para a instituição que realizou as
operações, mas sem grandes desdobramentos para a economia como um
todo. No entanto, a estrutura dos mercados financeiros atual, trouxe
modificações importantes na dinâmica desta crise. Com uma ampla
integração dos mercados financeiros e uma rede de pagamentos e
recebimentos articulada dentro do próprio mercado bancário, que em
última instância era comprado por fundos de investimento, fundos de
pensão, empresas e famílias, esta crise se acentuou (SCHLÖGL,
2011, p. 40).
Países centrais e emergentes
Segundo
Dulci (2009, p. 109):
Na
virada de 2008 para 2009, verificou-se que os países centrais
estavam entrando em recessão. Sobre os países emergentes, porém, o
efeito tem sido um pouco diferente. Suas economias apenas
desaceleraram, reduzindo a marcha em comparação com os altos
índices de crescimento experimentados nos últimos anos. E entre
eles há distinções a fazer. Variáveis como o tamanho do mercado
interno de cada país e o seu grau de autonomia em relação à
economia mundial são cruciais como dimensões de vulnerabilidade ao
contágio da crise. Além disso, as condições do sistema financeiro
interno, e sua dependência do exterior, certamente contam, e muito
(DULCI, 2009, p. 109).
A atenção
às diferenças é a base para elaborar comparações a partir das
quais se possam extrair inferências mais sólidas sobre a crise e
seus desdobramentos do que permite o volume de conhecimento que temos
hoje. Por enquanto, sabemos ainda pouco. Palpites de todo tipo têm
circulado pelo mundo, e nem sempre transmitem suficiente consistência
analítica. Diante disso, podemos tomar como bússola as
transformações das últimas décadas e, nesse contexto, situar o
que está acontecendo agora. Um balanço do passado é imprescindível
para qualquer antecipação do futuro (DULCI, 2009, p. 109).
Com
a retração dos fluxos de comércio e capitais e a desaceleração
do crédito, os efeitos da crise financeira sobre a atividade
econômica no mundo foram sentidos no quarto trimestre de 2008. O PIB
mundial do quarto trimestre de 2008, quando comparado ao PIB do
quarto trimestre de 2007, registrou variação negativa de 0,1%. Esta
desaceleração ocorreu de forma mais acentuada nas economias
avançadas, onde a redução foi de 2,2%, com maior destaque para os
EUA (-1,9%), Zona do Euro (-1,7%), Japão (-4,5%) e Reino Unido
(-1,8%). No ano de 2008, o PIB do grupo das economias avançadas
registrou crescimento de 0,5% em relação ao ano anterior (INSTITUTO
BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA, 2010, p. 14).
Para
impedir que o pânico tomasse conta da Europa foi necessário a
aprovação, em maio de 2010, de um pacote emergencial de 750 bilhões
de euros para socorrer os países em dificuldades. Mais uma vez os
Estados nacionais e a União Europeia não pouparam esforços para
garantir a continuidade da valorização fictícia do capital, que
consiste em uma das principais causas da crise. A saída encontrada
por esses países e pela União europeia foi socializar os prejuízos.
O ônus do ajuste foi jogado nas costas da classe trabalhadora, pois
a contra partida do auxílio financeiro consiste na aplicação de
rígidas políticas de combate ao déficit público, que implicam
medidas contencionistas.
Bolha imobiliária |
Ou seja, medidas recessivas que resultam no
agravamento do desemprego, na redução de salários e na perda de
direitos sociais. Mas, “apesar das amplas manifestações de
repudio a essas políticas nos países atingidos, a classe
trabalhadora não tem conseguido, até o momento, reverter esse
Gráfico” (CORSI, 2011, p. 13).
O
encontro em Pittsburgh, no final de setembro de 2009, resultou no
aumento significativo da importância das reuniões do G20.87
As decisões dos vinte países mais ricos do mundo
determinariam a direção da economia mundial, antes reservado para
as reuniões do G7 ou G8. Entre as decisões tomadas no G20 de
Pittsburgh, estavam as limitações dos bônus dos gerentes, onde os
chefes das empresas precisariam focar ganhos em longo prazo e não
ganhos arriscados e em curto prazo. Negócios arriscados levaram à
bolha financeira que originou a crise atual. Os gerentes foram
fortemente criticados, pois embora fossem responsáveis pela crise e
mesmo que a empresa necessitasse da ajuda do governo, eles
continuaram a ganhar prêmios horrendos (FRUCHS, 2010, p. 45).
A redução
no ritmo de crescimento econômico das nações é justificada pela
forte dependência externa, tanto no fluxo do comércio exterior
quanto no fluxo de capitais. Essa dependência de um país para com o
resto do mundo fica evidente ao se analisar as importações de
algumas dessas nações. Os EUA, detentor do maior PIB do mundo, no
ano de 2008 importaram um montante superior a 15% de seu PIB. Já nos
três primeiros trimestres de 2009, não importaram mais que 10,9% em
média do valor correspondente ao seu PIB. A Indonésia, entre o
fechamento de 2008 e o terceiro trimestre de 2009 deixou de importar
mais de 8,7%, comparativamente ao seu PIB (HERSEN & LIMA, 2010,
p. 39).
Os
primeiros sinais de reversão já começam em 2004, quando os Estados
Unidos elevam suas taxas de juros, encarecendo o refinanciamento dos
débitos. Em meados de 2006, esse processo emite os seus primeiros
sinais de esgotamento com a redução da taxa de crescimento do
crédito ao consumo e o leve aumento da inadimplência. Com isso, a
eclosão da crise do setor imobiliário era uma questão de tempo
(CARCANHOLO, 2010, p. 8).
Ainda no
início da crise, o Presidente do FED, Ben Bernanke, aplicou quase
500 bilhões de dólares no mercado imobiliário. Com esse dinheiro,
o FED comprou hipotecas e, desse modo, injetou dinheiro parar dar
liquidez ao mercado financeiro. Outra forma que o governo adotou para
disponibilizar recursos financeiros foi à compra de títulos
públicos. A falta de liquidez foi um grande problema durante o auge
da crise. Com pouca confiança nas instituições financeiras, a
oferta de créditos e empréstimos tornou-se um negócio arriscado
(FRUCHS, 2010, p. 30).
Segundo
Fruchs (2010) o efeito-contágio da crise sobre as regiões
emergentes ocorreu mediante vários canais de transmissão - que
derivam das múltiplas relações de interdependência entre as
economias emergentes e avançadas -, envolvendo seja a conta corrente
(queda dos preços das commodities e da demanda mundial e
aumento das remessas de lucros pelas empresas e bancos) seja a conta
financeira (menor ingresso de investimento direto, saída dos
investimentos de portfólio, interrupção das linhas de crédito
comercial e forte contração dos empréstimos bancários).
A crise
agravou-se quando os clientes subprimes
não honraram seus empréstimos. Para alguns o prejuízo
foi perder os imóveis e para outros um endividamento maior que suas
rendas, devido à elevação da taxa de juros no mercado. O resultado
foi o aumento sem precedentes da inadimplência e a insolvência das
instituições financeiras. Os resultados indicam que a crise
norte-americana teve início no mercado financeiro e se transferiu
posteriormente para o mercado produtivo, pela retração do crédito,
desencadeando recessão mundial pelo mercado externo.
Os países
de maior dependência externa e maior relação com os Estados Unidos
sofreram o impacto de forma mais agressiva (HERSEN & LIMA, 2010,
p. 25).
A
crise se manifestou inicialmente no segmento do mercado com mais
risco, que é aquele representado por tomadores com histórico de
inadimplência. Desde julho de 2006 o preço dos imóveis começa a
cair, o que reduz a riqueza das famílias e, com juros mais caros,
amplia a inadimplência no pagamento das hipotecas, o que reduz ainda
mais o crédito imobiliário e gera um processo cumulativo através
de uma nova redução no preço dos imóveis. Detonada a crise, o seu
processo de expansão e contágio se dá pelo fato de que, ao
aumentar a inadimplência, os credores passam a sofrer também com
problemas de liquidez e solvência, uma vez que os ativos que eles
tinham a receber são desvalorizados e, portanto, seus compromissos
financeiros podem não ter mais garantia de pagamento. Os credores
são obrigados a vender (parte de) seus ativos em troca de dinheiro
para, com este, saldar suas obrigações. Esse movimento de venda de
ativos provoca a redução dos seus preços e reforça a pressão
pela alta da taxa de juros cobrada pelas instituições financeiras,
agravando ainda mais crise (CARCANHOLO, 2010, p. 8).
Os grandes
bancos carregados com títulos hipotecários, por sua vez, sofrem uma
elevação no montante de seus passivos, uma vez que os juros estão
aumentando, ao mesmo tempo em que seus ativos (carregados em
“títulos, agora, podres”) se desvalorizam. O resultado é que,
reforçado pela redução na oferta de liquidez, a elevação na
descapitalização é respondida pelos bancos com a redução na
oferta de crédito, o que aprofunda os problemas de liquidez e
inadimplência (CARCANHOLO, 2010, p. 8).
A crise
atingiu um estado agudo em setembro de 2008 a partir da falência do
banco de investimentos Lehman Brothers. Não tanto pelo que esse
banco tinha no sistema financeiro norte-americano ou mundial, mas
muito mais pelo efeito simbólico, pois trouxe à luz a situação
generalizada de insolvência do sistema financeiro no centro do
capitalismo (EUA e Europa). Esse episódio desencadeou uma onda de
pânico, que não se converteu em corrida geral contra os bancos em
virtude da rápida ação dos bancos centrais dos países
desenvolvidos, garantindo os depósitos e injetando centenas de
bilhões de dólares para evitar o colapso da liquidez do sistema
financeiro (CORSI, 2009, p. 77).
A
crise financeira rapidamente se desdobrou em crise econômica,
sobretudo à forte redução do crédito. Ao atingir a produção a
crise ganha nova dinâmica. As quedas na produção, no emprego e nos
investimentos alimentam a crise, que se propaga e se aprofunda. A
elevação do desemprego vai alimentar o processo, pois muitos
tomadores de empréstimos desempregados não terão condições de
honrar suas dívidas e, portanto, a inadimplência aumentará. O
aumento da inadimplência de empresas e pessoas físicas reforça a
degeneração do sistema financeiro, o que por sua vez acelera a
crise na produção. A queda da atividade econômica leva a redução
das receitas públicas e pode gerar também um processo
deflacionário, que potencia a circulo cumulativo da crise (CORSI,
2009, p. 78).
Em busca
de rendimentos maiores, gestores de fundos e bancos compram esses
títulos subprimes das instituições que fizeram o primeiro
empréstimo e permitem que uma nova quantia em dinheiro seja
emprestada, antes mesmo do primeiro empréstimo ser pago. Um segundo
gestor pode comprar o título adquirido pelo primeiro, e assim por
diante, gerando uma cadeia de venda de títulos e uma espiral de
especulação financeira.
Os
tomadores iniciais de empréstimos não conseguem honrar seus
compromissos assumidos e se tem início a uma nova crise do sistema
capitalista. Se a crise se restringisse apenas a uma região, no caso
os Estados Unidos da América, seus efeitos não seriam tão
devastadores sobre a economia mundial. Porém, dada a
interdependência das economias, os mecanismos de contágio e
transbordamento das crises ainda necessitam de mais estudos (HERSEN &
LIMA, 2010, p. 26).
A
formação e o estouro de bolas especulativas têm caracterizado o
padrão de acumulação do capitalismo globalizado. A instabilidade
da economia mundial na fase de predomínio do capital financeiro está
intimamente vinculada às bolhas especulativas (BRENNER, 2003 e 2006)
(CORSI, 2009, p. 82).
A crise já
se ensaiava anteriormente quando da formação da bolha especulativa
junto às ações de empresas de alta tecnologia, as famosas empresas
pontocom. O estouro dessa bolha nada mais representou do que a
desvalorização do capital fictício acumulado especulativamente
nesse mercado que, com a sua retração, se viu obrigado a encontrar
novos espaços de valorização, ou pelo menos para aquela parcela do
capital fictício que sobrou ao estouro dessa bolha (CARCANHOLO,
2010, p. 8).
Essa
dinâmica econômica baseada na bolha especulativa com imóveis
centrada nos EUA, que descrevemos muito esquematicamente acima, não
é novidade na economia mundial no período recente. Desde o final
dos anos 1980, o ciclo econômico está vinculado à formação e ao
estouro e bolhas especulativas. Entre 1990 e 2007, tanto os momentos
de expansão quanto os de retração estiveram condicionado pela
formação e pelo estouro de bolhas especulativas. Nesse período,
foram seis crises: recessão 1990-1991, México (1994), Sudeste
Asiático (1997), Rússia/Brasil/Argentina (1998 – 1999), Nasdaq
(2001) e crise da bolha imobiliária (2008). Também ocorreu uma
série de crises localizadas nos países centrais, como, por exemplo,
as corridas especulativas contra a libra, a lira e a peseta no início
dos anos 1990 e a quebra de instituições e poupança nos EUA em
1994. Não caberia nos limites desse artigo detalhar esse processo,
pois cada crise tem suas múltiplas determinações, cabe, contudo,
ressaltar um aspecto de grande importância, qual seja: esse padrão,
de um lado, vincula-se intimamente a hegemonia do capital financeiro
e, de outro, a formação de uma nova fronteira de acumulação de
capital no Leste Asiático (CORSI, 2011, p. 16).
A bolha
das ações da década de 90 demonstrou, por um lado, que teve um
extremo otimismo para que se ganhasse muito dinheiro nas negociações
com ações e, por outro, que teve a crença que as crises e as
recessões eram coisas do passado e assim houve um grande senso de
segurança. Assim os preços das ações chegaram a níveis
extremamente “espantosos”. A bolha continuou crescendo cada vez
mais. Já a segunda bolha, a bolha do setor imobiliário, originou
essa crise global. A falta de confiança iria prevalecer por muito
tempo no mercado e dado cada vez piore do setor imobiliário
afetariam a economia norte americana por muitos meses. O sonho de
cada americano de ter a casa própria, que muitas vezes, era comprada
com empréstimos. Alan Grenspan mesmo sabendo da bolha não interveio
para diminuir os riscos de colapsos maiores (FRUCHS, 2010, p. 21).
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